Direito Constitucional

Análise do trabalho obrigatório do preso numa perspectiva constitucional (Trabalho forçado x trabalho obrigatório)

Há quem afirme que o trabalho é a melhor forma de ocupar o tempo ocioso, outros o vêem como meio de sobrevivência, que exprime e realiza, por si mesmo, a dignidade do homem.

 

O trabalho prisional, especificamente, é visto como meio de reduzir os efeitos criminógenos da prisão, em virtude da ocupação dada ao tempo do apenado.

 

Ora, é a Lei de Execução Penal, em seu art. 28, que estabelece o trabalho do condenado como dever social e condição de dignidade humana que terá finalidade educativa e produtiva.

 

Há quem entenda, ainda, que a vontade do legislador pátrio não foi tão somente estimular o trabalho do preso, ou conscientizá-lo de sua importância, mas pretendeu obrigar o homem que está preso definitivamente, a trabalhar[1].

 

Razão existe no pensamento de Alfredo Issa Ássaly, citado por Renato Marcão [2], que entende que “o trabalho presidiário, consagrado em todas as legislações hodiernas, constitui uma das pedras fundamentais dos sistemas penitenciários vigentes e um dos elementos básicos da política criminal”.

 

Ocorre que algumas confusões surgem quando se discute a questão do trabalho do preso. Isto porquê a legislação penal prevê que o trabalho do condenado é obrigatório, sendo, inclusive, considerado um dever social, conforme o supramencionado artigo. Em contraposição, a Constituição de 1988, em seu artigo 5º. XLVII, “c”, veda a imposição de pena de trabalhos forçados.

 

Em virtude disto, alguns questionamentos são feitos: ao se determinar que o preso que se recusa a realizar trabalho seja privado de benefícios legais, não se está, indiretamente, forçando-o a trabalhar? Impor uma sanção contra a sua inércia, não seria impô-lo um trabalho forçado?[3]  O dispositivo da obrigatoriedade não diz respeito ao trabalho forçado?

 

Diante da interpretação do dispositivo infraconstitucional à luz da Carta Magna, que determina que não haverá pena de trabalhos forçados, há uma tendência de entender a Lei de Execução Penal como inconstitucional.

 

Como nos ensina Cezar Roberto Bitencourt[4], a despeito do trabalho ser obrigatório, hoje, ele é um direito-dever do apenado e será sempre remunerado, consoante intelecção do art. 29 da LEP.

 

Ademais, a nossa legislação permite a remição de um dia de pena para cada três dias trabalhados pelo preso. O art. 126, § 1º da Lei de Execução Penal, estabelece que “o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo da execução da pena”.

 

Assim sendo, diferente do que se pensa, apesar do trabalho ser obrigatório, ele não é forçado, já que o apenado pode optar por não trabalhar, se esta for a sua vontade. Ora, as conseqüências disto é que o preso não terá sua pena remida pelo trabalho, porém não sofrerá qualquer penalidade.

 

Destarte, é obrigatório fornecer ao apenado condições de trabalho, a fim de que ele possa remir parte da sua pena. Ora, ao Estado incumbe o dever de dar trabalho ao condenado em cumprimento de pena de liberdade, ou àquele a quem se impôs medida de segurança definitiva. É direito do preso a atribuição de trabalho e sua remuneração, consoante art. art. 41, II, da LEP. Todavia, sob nenhuma hipótese, ele é forçado a trabalhar contra a sua vontade.

 

Isto posto, percebe-se que o dispositivo da Lei de Execuções Penais está em sintonia com a Lei Maior. Ora, como bem explica Luíz Flávio Borges D’Urso, a vedação ao trabalho forçado existe no nosso ordenamento, enquanto pena, motivo pelo qual não se pode admitir que o indivíduo seja apenado com a privação de liberdade e com a obrigatoriedade do trabalho, já que seria proporcionar um excesso de pena  “bis in idem” –  expressamente vedado pela Constituição Federal. 

 

Levando em consideração que a obrigatoriedade do trabalho ao preso corresponde à uma premiação para aquele que trabalhou, resta claro que a legislação infraconstitucional não entra em choque com a Carta Magna.

 

 

REFERÊNCIAS

 

1 D’URSO, Luíz Flávio Borges. O trabalho do preso. Retirado da página da Web: http://www.mundolegal.com.br/Default.cfm?FuseAction=Artigo_Detalhar&did=10260&Assunto=penal

2   MARCÃO, Renato. Curso de Execução Penal. 7ª edição. Editora Saraiva, 2009.

3 Trabalho do preso: obrigatório em duas frentes. Retirado da página da Web: http://yudicerandol.blogspot.com/2007/10/trabalho-do-preso-obrigatrio-em-duas.html.

4 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral 1. 10ª Edição. Editora Saraiva, 2006.

 

 

 

 * Bacharelanda em Direito pela Universidade Estadual de Feira de Santana, 9º semestre. Estagiária da 2ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais da comarca de Feira de Santana.

Como citar e referenciar este artigo:
LUSTOSA, Dayane Sanara de Matos. Análise do trabalho obrigatório do preso numa perspectiva constitucional (Trabalho forçado x trabalho obrigatório). Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2010. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-constitucional-artigos/analise-do-trabalho-obrigatorio-do-preso-numa-perspectiva-constitucional-trabalho-forcado-x-trabalho-obrigatorio/ Acesso em: 25 abr. 2024