Responsabilidade Civil

O Avanço do Terrorismo

O Avanço do Terrorismo

 

 

Ives Gandra da Silva Martins *

 

 

Em artigo publicado na Folha, em 09/04/2003 (O terrorismo oficial de Bush), manifestei entendimento no sentido de que a ação desmesurada, desnecessária e desinformada de Bush no Iraque abria campo para reações, cuja magnitude era impossível de se vislumbrar, mas que poderiam redundar no incentivo ao terrorismo.

 

Passados 3 anos, aquela invasão, criticada pela Comunidade Internacional, encetada como contraponto à tragédia das torres gêmeas, conseguiu destruir um país organizado, prender e condenar um ditador idoso, em fim de “carreira”, incrementar o terrorismo, acelerar a corrida nuclear e tornar o terrorismo a arma das nações fracas contra as fortes, que se arvoram em senhoras da paz e da guerra.

 

O caos no Iraque e no Afeganistão, o morticínio diário, nos dois países invadidos, inclusive de americanos, o fortalecimento nuclear de duas outras nações, que se consideraram ameaçadas por Bush, por terem sido denunciadas como participantes do eixo do mal (Irã e Coréia do Norte), assim como as dificuldades crescentes de Israel em conviver com seus vizinhos islâmicos, com aumento de incursões, destruições e mortes de inocentes, demonstram que as técnicas de luta contra o terrorismo, que utilizam a força e não a inteligência, a violência e não o diálogo, equivalem a lançar gasolina numa fogueira tentando apagá-la, na crença de que por ser líquido o combustível, o fogo desapareceria.

 

Bush não percebe, apesar da imensa rejeição até do povo americano (no mundo inteiro, americanos, ingleses e canadenses, enfim, a maioria da população lamenta a continuação da guerra no Iraque), que fracassou. Repito fracassou em transformar o Iraque numa democracia, tendo destruído, em contrapartida, Bagdá, a mais bela cidade oriental antes da invasão, após aniquilar o frágil regime de Saddam, em duas ou três semanas. É que o limitado líder americano não percebeu que os povos são diferentes, as culturas diversas, e que o terrorismo de “mártires” só pode ser vencido com base em diálogo, por se alimentar da repressão, gerando tanto mais mortes, quanto mais forte o poder de fogo das nações poderosas.

 

Em meu livro “Uma visão do mundo contemporâneo” de 1996, traduzido para o russo e romeno, previ o aumento do terrorismo, se o combate fosse feito à luz do fogo contra fogo. E que atentados como o das torres americanas poderiam ocorrer, o que infelizmente aconteceu.

 

Lamentavelmente, estava certo, e não o Presidente Bush e seus assessores, com o que, colhe, agora, os resultados da desastrada intervenção promovida por ele e seus aliados, alguns deles já tendo tido o bom senso de se retirar do destruído Iraque.

 

Muitas vezes, coloco-me o problema: por que –em pleno século XXI- as nações desenvolvidas se arvoram o papel de defender os destinos das nações menos desenvolvidas, mediante o controle  da utilização da energia nuclear, que não admitem em seu próprio território? Por que a insistência em se porem a salvo do alcance de tribunais penais internacionais? Por que a aplicação de sanções aos povos emergentes considerados inimigos, sempre mais severas quanto mais rebeldes forem as reações de seus líderes? Não é nunca tarde lembrar que, na Corte de Haia – cuja vaga brasileira foi perdida pelo Governo Lula – Ruy Barbosa defendeu a tese de que a “força do direito” deveria prevalecer sobre o “direito da força”. Em outras palavras, contestava, à época, o direito de qualquer potência, inclusive os Estados Unidos, se auto-outorgar o poder de dizer o que é certo e o que é errado para todo o mundo.

 

Creio que, se não revertermos esta visão “calicliana” (em referência ao personagem de Gorgias, de Platão) de que “ao mais forte cabe o direito a sua força, e ao mais fraco o direito a sua fraqueza”, o terrorismo continuará sendo a arma do fraco contra o forte, impondo à humanidade um preço descomunal.

 

Somente o diálogo, muito diálogo e espírito desarmado podem provocar a reversão deste quadro. Caso contrário, o terrorismo continuará em crescimento e a humanidade –em pleno século XXI viverá a insegurança máxima, em todos os países e em todos os povos.

 

 

* Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU e da Escola de Comando e Estado Maior do Exército, Presidente do Conselho de Estudos Jurídicos da Federação do Comércio do Estado de São Paulo e do Centro de Extensão Universitária – CEU. Site: www.gandramartins.adv.br

 

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Como citar e referenciar este artigo:
MARTINS, Ives Gandra da Silva. O Avanço do Terrorismo. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2008. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/responsabilidade-civil/o-avanco-do-terrorismo/ Acesso em: 29 mar. 2024