Direito Civil

Honorários advocatícios contratuais e o princípio da restitutio in integrum

1. Introdução:

No presente artigo, pretende-se abordar o novo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, que optou pelo descabimento da condenação do vencido ao ressarcimento dos honorários contratuais do advogado que atuou no processo em favor da parte vencedora. Para tanto, utilizam-se argumentos de lógica jurídica, bem como o princípio da restitutio in integrum, que é consectário do Juris Praecepta Sunt haec: Honeste Vivere, Alterum Non Laedere, Suum Cuique Tribuere.

2. Conceito de responsabilidade civil e o princípio da restitutio in integrum

O termo “responsabilidade” advém do verbo latino respondere, que, por sua vez, significa o fato de alguém ser constituído garantidor de alguma coisa[1]. Já o termo respondere, possui raiz latina spondeo, “fórmula pela qual se vinculava, no direito romano, o devedor nos contratos verbais”.[2]

O conceito de responsabilidade deve ter o enfoque de corrigir uma situação na qual alguém não cumpre o seu dever, seja fruto de uma violação contratual ou de uma infração da norma.

Diversas são as conceituações de responsabilidade. Por sua completude, adota-se o conceito de Maria Helena Diniz, que a define como o emprego de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou fato de coisas ou animal sob sua guarda ou, ainda, de simples imposição legal.[3]

Nota-se que no conceito trazido consta o termo “reparar”. É nisso que se baseia todo conceito de responsabilidade civil, que pode ter outras variáveis, como, por exemplo, a presença da culpa com elemento de existência.

O direito brasileiro estabelece no artigo 927 do Código Civil que: “Aquele que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.”

Destaca-se, deste modo, que a responsabilidade civil tem uma função principal, como ensina Fernando de Sandy Lopes Pessoa Jorge. Para o jurista português, a função primária da responsabilidade civil é a reparadora.[4]

Sergio Cavalieri Filho ensina que o direito brasileiro sempre prestigiou o princípio da reparação integral (restitutio in integrum), desde o código de 1916 até o atual, porquanto este prescreve que “A indenização mede-se pela extensão do dano”.[5] Lembra, por isso, da síntese feita pela doutrina francesa: tout le dommage, mais rien que le dommage, que quer dizer, todo o dano, mas nada além do dano. De fato, sempre houve essa concepção de que o limite para a indenização era o tamanho do dano, independente do seu tipo, se patrimonial ou se extrapatrimonial. Constata-se isso, por exemplo, num acidente automotivo. Se a vítima teve um prejuízo de R$1.000,00 (um mil reais), é esse mesmo valor que deverá receber do seu causador.

Esse entendimento sempre prevaleceu no Direito, principamente quando se fala em dano material. Neste caso, deve haver clara obediência aos parâmetros estabelecidos pelo caput do artigo 944 do Código Civil.

Nesse sentido, jurisprudência a seguir:

AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – ACIDENTE DE TRÂNSITO – RITO SUMÁRIO – PENSÃO MENSAL ATÉ 65 ANOS – DANOS TEMPORÁRIOS – PRINCÍPIO DA RESTITUTIO IN INTEGRUM – PENSIONAMENTO INDEVIDO – DPVAT – DEDUÇÃO – FALTA DE COMPROVAÇÃO DE PAGAMENTO – INDEVIDA – TAXA DE JUROS – 6% AO ANO – ATO ILÍCITO – REGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916 – DENUNCIADA À LIDE – PAGAMENTO DOS ENCARGOS SUCUMBENCIAIS. A condenação ao pagamento de danos morais deve se dar tal como posta na primeira instância, vez que referida matéria não foi devolvida à análise deste tribunal. O princípio da restitutio in integrum, no âmbito da responsabilidade civil, aponta que não se deve dar menos do que o efetivo prejuízo sofrido, partindo-se, sempre, da premissa de que se deve reparar o dano causado à vítima integralmente, retornando-se, preferencialmente, ao statu quo ante. Se o laudo pericial permite antever que o autor está apto a trabalhar, vez que não lhe foi causado dano permanente algum, não há que se falar em pensionamento até os 65 anos de idade, até porque haverá recomposição indenizatória referente ao período em que ele ficou sem trabalhar, a qual será consubstanciada em 24 parcelas equivalentes, cada uma, ao líquido salarial percebido à época do desastre. Não há que se falar em dedução do valor correspondente ao seguro obrigatório (DPVAT) do quantum indenizatório, porquanto não restou comprovado que ditos valores foram efetivamente pagos à vítima. Deve-se reduzir o percentual de juros moratórios a 6% ao ano, vez que o acidente ocorreu sob a égide do Código Civil de 1916, razão pela qual deve-se respeitar o limite inserto no art , 1.062 do antigo diploma. O fato de a denunciada ter aceitado a denunciação não a exime de pagar custas e honorários advocatícios. Se o réu-denunciante foi vencedor na lide secundária, é natural que faça jus ao recebimento das verbas despendidas. (TJ-MG 100249712262380011 MG 1.0024.97.122623-8/001(1), Relator: FABIO MAIA VIANI, Data de Julgamento: 03/05/2007, Data de Publicação: 01/06/2007). (Grifo nosso).

É importante ressaltar que há uma única exceção ao princípio da restitutio in integrum. É a que consta no parágrafo único do artigo 944 do Código Civil Brasileiro que “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização.”

Maria Helena Diniz também traz preciosas lições para reflexão acerca do princípio da restitutio in integrum:

Grande é a importância da responsabilidade civil, nos tempos atuais, por se dirigir à restauração de um equilíbrio moral e patrimonial desfeito e à redistribuição da riqueza de conformidade com os ditames da justiça, tutelando a pertinência de um bem, com todas as suas utilidades, presentes e futuras, a um sujeito determinado, pois, como pondera José Antônio Nogueira, o problema da responsabilidade é o próprio problema do direito, visto que ‘todo o direito assenta na ideia da ação, seguida da reação, de restabelecimento de uma harmonia quebrada. […] A responsabilidade civil pressupõe uma relação jurídica entre a pessoa que sofreu o prejuízo e a que deve reperá-lo, deslocando o ônus do dano sofrido pelo lesado para outra pessoa que, por lei, deverá suportá-lo, atendendo assim à necessidade moral, social e jurídica de garantir a segurança da vítima violada pelo autor do prejuízo. Visa, portanto, garantir o direito do lesado à segurança, mediante o pleno ressarcimento dos danos que sofreu, restabelecendo-se na medida do possível o statu quo ante. Logo, o princípio que domina a responsabilidade civil na era contemporânea é o da restitutio in integrum, ou seja, da reposição completa da vítima à situação anterior à lesão, por meio de uma reconstituição natural, de recurso a uma situação material correspondente ou de indenização que represente de modo mais exato possível o valor do prejuízo no momento de seu ressarcimento, respeitando assim, sua dignidade.[6] (Grifo nosso)

Pelas considerações expostas, verifica-se que o princípio que guia toda responsabilidade civil, ou mesmo o direito, é o princípio da restitutio in integrum, que é consectário do Juris Praecepta Sunt haec: Honeste Vivere, Alterum Non Laedere, Suum Cuique Tribuere (os preceitos do direito são estes: viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o seu).

Com base nisso, indaga-se: os honorários contratuais gastos pela parte vencedora de um processo devem ser indenizados pela parte perdedora?

3. Entendimento do Superior Tribunal de Justiça

Antes de darmos nossa opinião, vejamos os dois entendimentos possíveis, expressos na jurisprudência.

STJ, decisão de junho de 2011:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VALORES DESPENDIDOS A TÍTULO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. PERDAS E DANOS. PRINCÍPIO DA RESTITUIÇÃO INTEGRAL.

1. Aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos pela outra parte com os honorários contratuais, que integram o valor devido a título de perdas e danos, nos termos dos arts. 389, 395 e 404 do CC/02.

2. Recurso especial a que se nega provimento.

(REsp 1134725/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 24/06/2011). (Grifo nosso).

A controvérsia decidida no REsp cinge-se a determinar se os honorários advocatícios contratuais integram os valores devidos a título de reparação por perdas e danos.

Na íntegra do acórdão, nota-se seguinte fundamentação:

O Código Civil de 2002 – nos termos dos arts. 389, 395 e 404 – determina, de forma expressa, que os honorários advocatícios integram os valores devidos a título de reparação por perdas e danos. Os honorários mencionados pelos referidos artigos são os honorários contratuais, pois os sucumbenciais, por constituírem crédito autônomo do advogado, não importam em decréscimo patrimonial do vencedor da demanda. Assim, como os honorários convencionais são retirados do patrimônio da parte lesada – para que haja reparação integral do dano sofrido – aquele que deu causa ao processo deve restituir os valores despendidos com os honorários contratuais. Trata-se de norma que prestigia os princípios da restituição integral, da equidade e da justiça. Por fim, para evitar interpretações equivocadas da presente decisão, cumpre esclarecer que, embora os honorários convencionais componham os valores devidos pelas perdas e danos, o valor cobrado pela atuação do advogado não pode ser abusivo. Dessarte, se o valor dos honorários contratuais for exorbitante, o juiz poderá, analisando as peculiaridades do caso concreto, arbitrar outro valor, podendo utilizar como parâmetro a tabela de honorários da OAB. Tendo em vista que não houve pedido do recorrente quanto ao reconhecimento da abusividade das verbas honorárias, a referida questão não será analisada no presente recurso especial, pois, nos termos do princípio da congruência, a decisão não pode ultrapassar os limites do pedido. Forte nessas razões, nego provimento ao recurso especial. (Grifo nosso).

Todavia, em que pese tal entendimento, atualmente, outro prevalece no Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. CPC/1973. AÇÃO DE COBRANÇA.

HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS E DE ASSISTENTE TÉCNICO. ATUAÇÃO EM OUTRA DEMANDA. DESCABIMENTO DO AJUIZAMENTO DE AÇÃO DE COBRANÇA CONTRA O VENCIDO PARA PLEITEAR RESSARCIMENTO DE HONORÁRIOS CONTRATUAIS DO ADVOGADO QUE ATUOU NO LITÍGIO ANTERIOR. JULGADOS DESTA CORTE SUPERIOR. OMISSÃO DA SENTENÇA QUANTO AO RESSARCIMENTO DOS HONORÁRIOS DO ASSISTENTE TÉCNICO. AJUIZAMENTO DE AÇÃO AUTÔNOMA. DESCABIMENTO.

APLICAÇÃO DO ENTENDIMENTO FIRMADO NA SÚMULA 453/STJ.

1. Controvérsia acerca da possibilidade de se cobrar, em ação autônoma, honorários advocatícios contratuais e honorários de assistente técnico relativos à atuação em demanda anterior. 2.

Descabimento da condenação do vencido ao ressarcimento dos honorários contratuais do advogado que atuou no processo em favor da parte vencedora. Jurisprudência pacífica desta Corte Superior.

3. Distinção entre honorários contratuais e de sucumbência.

4. “Os honorários sucumbenciais, quando omitidos em decisão transitada em julgado, não podem ser cobrados em execução ou em ação própria” (Súmula 453/STJ). 5. Aplicação do entendimento consolidado na Súmula 453/STJ à hipótese de sentença omissa quanto à condenação ao ressarcimento de honorários do assistente técnico. 6. Tratamento diverso da matéria pelo CPC/2015.

7. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

(REsp 1566168/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2017, DJe 05/05/2017)

Na íntegra do acórdão, nota-se seguinte fundamentação:

No caso da atuação judicial do advogado, a condenação do vencido se limita aos honorários de sucumbência, não havendo previsão legal para se acrescentar uma condenação ao ressarcimento dos honorários contratuais. Entendeu-se que a parte vencida, ao propor a demanda ou ao oferecer contestação, não age ilicitamente, pois exerce o direito constitucional de ação/defesa (art. 5o, incisos XXX e LV), valendo então o brocardo romano “non videtur malum facere, qui jure suo utitur” – não parece agir mal quem se utiliza do próprio direito. Assim, não havendo ilicitude na atuação do vencido, descabe impor-lhe a obrigação de indenizar a parte vencedora pelos prejuízos decorrentes da contratação de advogado. (Grifo nosso).

Esse é, portanto, o entendimento atualizado no Superior Tribunal de Justiça.

Não obstante, o melhor é aquele atualmente superado.

4. Nosso entendimento

O primeiro ponto a ser clareado é a obrigatoriedade do respeito ao princípio da restitutio in integrum, que é consectário do Juris Praecepta Sunt haec: Honeste Vivere, Alterum Non Laedere, Suum Cuique Tribuere (os preceitos do direito são estes: viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o seu).

Pense-se, por exemplo, no caso de determinado jornalista, polêmico por suas opiniões, ser processado civilmente por algumas supostas vítimas. Imagine-se, ainda, que o jornalista ganhe todos estes processos.

Considerando que o dano material deve ser medido pela diferença entre o valor atual do patrimônio e aquele que teria, no mesmo momento, se não houvesse a lesão, não teria o profissional sofrido dano patriomial ao ter que surpotar, sem reembolso, os honorários contratuais dispendidos com seu advogado?

Sabe-se que o dano material tem como característica principal a certeza, só podendo ser reconhecido quando constatado prejuízo real suportado e provado pela vítima.

Assim, no caso do jornalista, aplicando o atual entendimento do STJ, cada processo sofrido lhe diminuirá o patrimônio, pois prevalece o entendimento de que a condenação do vencido se limita aos honorários de sucumbência, não havendo previsão legal para se acrescentar uma condenação ao ressarcimento dos honorários contratuais.

Portanto, a cada processo ajuizado, uma parte do patrimônio do jornalista se perde, podendo, inclusive, tais ajuizamentos levarem-no à miséria.

Em termos práticos, a cada novo processo, novo valor será dispendido com honorários contratuais, já que os advogados não ficam adstritos apenas aos honorários sucumbenciais.

Prevalecesse ainda o entedimento previsto na exposição de motivos que baseou o Código de Processo Civil de 1973, melhor seria:

O projeto adota o princípio do sucumbimento, pelo qual o vencido responde por custas e honorários advocatícios em benefício do vencedor. O fundamento desta condenação, como escreveu Chiovenda, é o fato objetivo da derrota: e a justificação deste instituto está em que a atuação da lei não deve representar uma diminuição patrimonial para a parte a cujo favor se efetiva; por ser interesse do Estado que o processo não se resolva em prejuízo de quem tem razão e por ser, de outro turno, que os direitos tenham um valor tanto quanto possível e constante.[7] (Grifo nosso).

Todavia, pelo entedimento atual, além dos honorários contratuais, os de sucumbência também pertencem ao advogado, nos termos do art. 85 do Novo Código de Processo Civil: “A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.”

Voltando ao exemplo dado, caso uma suposta vítima ajuíze processo contra o jornalista requerendo R$100.000,00 a título de danos morais e o pedido for julgado improcedente, seu advogado irá receber entre R$10.000,00 e R$20.000,00 de honorários de sucumbência, além dos honorários contratuais, talvez mais R$10.000,00. Já o jornalista, inocente/vencedor, além do transtorno, terá o prejuízo de R$10.000,00 com seu patrono, não sendo jamais ressarcido por isso.

Imagine-se este caso multiplicado por 10. Não estaria o jornalista fadado à miséria?

Soma-se a isso, o fato de a lei não permitir que a parte vá, salvo poucas hipóteses, a juízo sozinha.

Isso significa que toda pessoa fica exposta a eventuais prejuízos de ordem material a depender tão somente da iniciativa, mesmo que descabida, de uma suposta vítima.

No caso do jornalista, imaginando que este não seja beneficiário da Justiça gratuita, qualquer demanda lhe imposta na justiça comum o levará a prejuízo, por mais defensável ou esdrúxula que seja, justamente porque a mesma lei que o obriga a contratar um advogado não lhe dá o direito de ser indenizado pelo gasto dispendido. O direito, que deveria privilegiar os que agem de modo escorreito, na verdade, os penaliza.

Desse a lei a faculdade de ir a juízo sozinho, menos injusto seria o entendimento atual.

No REsp 1566168/RJ, entendeu-se que, no caso da atuação judicial do advogado, a condenação do vencido se limita aos honorários de sucumbência, não havendo previsão legal para se acrescentar uma condenação ao ressarcimento dos honorários contratuais.

Além disso, entendeu-se que a parte vencida, ao propor a demanda ou ao oferecer contestação, não age ilicitamente, pois exerce o direito constitucional de ação/defesa (art. 5º, incisos XXX e LV), valendo então o brocardo romano “non videtur malum facere, qui jure suo utitur” – não parece agir mal quem se utiliza do próprio direito.

Ora, em primeiro lugar, quanto à falta de previsão legal, o Código Civil, no artigo 944, prevê, claramente, que “A indenização mede-se pela extensão do dano”. Ademais, a questão aqui posta enquadra-se planamente no conceito de dano material: “o dano patrimonial é a lesão concreta que afeta um interesse relativo ao patrimônio da vítima, consistente na perda ou deterioração, total ou parcial, dos bens materiais que lhe pertencem, sendo suscetível de avaliação pecuniária e de indenização pelo responsável.”[8] Além do que, caso se entenda pela existência de lacuna normativa, esta poderia ser preenchida pelos critérios estabelecidos na LINDB, que prevê, inclusive, a utilização de princípios gerais de direito (princípio da restitutio in integrum).

Em segundo lugar, o argumento de que a parte vencida, ao propor a demanda ou ao oferecer contestação, não age ilicitamente, pois exerce o direito constitucional de ação/defesa, também é desarrazoado. Só seria aplicável tal entendimento se o exercício do direito não causasse danos a outrem ou que, aquele submetido a vontade alheia, pudesse optar por estar ou não na relação. Explica-se. Por exemplo: quando se fala de negociações preliminares as partes, antes de pactuar, discutem os moldes do contrato. Por ser anterior à conclusão contratual, não há que se falar em responsabilidade civil, a menos que haja abuso de direito. Assim, a parte, mesmo gerando prejuízo à outra (exercício do direito de negociar), como despesas para demonstração do produto, não responderá por isso, porque o prejudicado teve a liberdade de ali estar. No caso aqui analisado, diferentemente, a parte é submetida ao direito de outrem, isto é, não tem a faculdade de estar ou não em juízo, de modo que, o simples exercício do direito contra aquele que não possui liberdade gera o dever de indenizar.

Portanto, o STJ, ao utilizar o brocardo romano “non videtur malum facere, qui jure suo utitur” – não parece agir mal quem se utiliza do próprio direito – poderia ter concluído: se não parece agir mal quem se utiliza do próprio direito, muito menos aquele submetido (sem liberdade) à desarrazoada pretensão geradora de dano.

Parece que se está protegendo o perdedor em prejuízo do vencedor. E diga-se: não se pretende aqui punir do perdedor. Reconhece-se o seu direito de demandar. Aqui fala-se tão somente em indenização por danos materiais, que não tem caráter punitivo, mas somente indenizatório. Quiséssemos tolher da parte o direito de utilizar o próprio direito, defender-se-ia, além do ressarcimento, a condenação por danos morais do perdedor, aplicando-se o seu caráter punitivo.

Assim, por uma interpretação sistemática, harmonizando todo ordenamento jurídico, o entendimento dos tribunais que deveria prevalecer é que cabe ressarcimento pelos honorários advocatícios contratuais dispendidos pelo vencedor, para garantir o direito ao lesado à segurança, mediante o pleno ressarcimento dos danos que sofreu, restabelecendo-se na medida do possível o statu quo ante.

Por fim, registra-se a concordância com o que já fora decidido no REsp 1134725/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/06/2011, DJe 24/06/2011:

Por fim, para evitar interpretações equivocadas da presente decisão, cumpre esclarecer que, embora os honorários convencionais componham os valores devidos pelas perdas e danos, o valor cobrado pela atuação do advogado não pode ser abusivo. Dessarte, se o valor dos honorários contratuais for exorbitante, o juiz poderá, analisando as peculiaridades do caso concreto, arbitrar outro valor, podendo utilizar como parâmetro a tabela de honorários da OAB.

Adota-se este entendimento porque, para estar em juízo, é preciso capacidade postulatória, e o mínimo, teoricamente, que pode ser cobrado, é o estabelecido na tabela da OAB. Assim, o juiz, ao analisar o valor cobrado a título de ressarcimento de honorários contratuais, poderá ter como parâmetro tal tabela.

5. Conclusão

Portanto, os honorários contratuais devem ser ressarcidos pela parte vencida, de modo que o princípio da restitutio in integrum possa ser respeitado, não sendo justificável que o processo se resolva em prejuízo de quem, com base na lei, tem razão, podendo, o juiz, na fixação do quantum, utilizar-se dos parâmetros previstos na tabela de honorários da OAB.

6. Referências

CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.32. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

JORGE, Fernando de Sandy Lopes Pessoa. Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil. Coimbra: Livraria Almedina, 1999.

Autor: Alexandre Castro Sousa – Doutorando e Mestre em Direito Civil Comparado pela PUC/SP – Bolsista Capes. Servidor Público Federal. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001. This study was financed in part by the Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Finance Code 001.



[1] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.28. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 49.

[2] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.28. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 49.

[3] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.28. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 51.

[4] JORGE, Fernando de Sandy Lopes Pessoa. Ensaio sobre os pressupostos da responsabilidade civil. Coimbra: Livraria Almedina, 1999, p. 52.

[5] CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil. 11. ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 27.

[6] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.32. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 21, 23-4.

[7] https://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/177828/CodProcCivil%201974.pdf?sequence=4

[8] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, volume 7: Responsabilidade Civil.32. ed. São Paulo: Saraiva, 2018, p. 145.

Como citar e referenciar este artigo:
SOUSA, Alexandre Castro. Honorários advocatícios contratuais e o princípio da restitutio in integrum. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-civil/honorarios-advocaticios-contratuais-e-o-principio-da-restitutio-in-integrum/ Acesso em: 19 abr. 2024