Direito Civil

Arbitragem: a importância de sua divulgação como meio de auxílio à sociedade, garantia de acesso à justiça e cidadania

Maria Fernanda Soares Macedo[1]

Sumário: 1) Direito e sociedade; 2) Conflitos sociais e a importância da atuação do Poder Judiciário; 3) Arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro; 4) Considerações finais; 5) Referências.

Resumo:

Os laços existentes entre a sociedade e ordenamento jurídico são muito fortes. Cabe ao Direito apresentar as normas e diretrizes para a organização da sociedade. Naturalmente, com a convivência entre os membros da sociedade, os conflitos surgem. Existem diversas formas para solucioná-los.

O foco do presente artigo é analisar a importância da arbitragem, no ordenamento jurídico brasileiro para a resolução dos conflitos e das lides, bem como de sua divulgação para a sociedade.

Palavras-chave: sociedade; conflitos; arbitragem.

Abstract:

The connections between the society and the laws are very strong. The laws present ways to organize the society. Obviously, there are lots of conflicts between people. And there are lots of ways to solve them.

The present article analyzes the laws from Brazil, specially the arbitrage, as one way to solve the conflicts. Also, it is really important to inform the population about the arbitrage.

Key-words: society, conflicts, arbitrage.

1) Direito e sociedade

A análise da estruturação da sociedade, bem como a sua composição, pautada por homens e normas é de extrema complexidade. Afinal, o vínculo entre os laços existentes entre ambos apresenta muita força e pode ser estudado por diversos enfoques.  Renomados doutrinadores se debruçam sobre o referido estudo.

Marcelo Fausto Figueiredo Santos entende que: [2]

“Etimologicamente, sociedade deriva do latim “societas”. Genericamente considerado no sentido filosófico, o termo pode ser decomposto e aplicado às relações intersubjetivas humanas de maneira geral, ou condicionada de alguma forma. Na Grécia Antiga, a polis englobava o conceito de sociedade tal qual hoje a entendemos. Já no jusnaturalismo é empregado o termo com objetivo preciso de fonte de Direito. Avançando um pouco mais verificamos a idéia de sociedade emparedada como associação necessária, útil, natural”.

O Direito apresenta diretrizes de conduta para o convívio social, visando o bem-estar, a estruturação e a pacificação dos membros da coletividade. Cumpre destacar, também, que com a evolução da sociedade, o desenvolvimento social e as relações dos homens, cada vez mais complexas, surgem cada vez mais necessidades e desejos a serem satisfeitos e conflitos a seres resolvidos. O Estado apresenta função primordial para a organização da sociedade.

Para Miguel Reale: [3]

“O Estado é uma realidade cultural, isto é, uma realidade constituída historicamente em virtude da própria natureza social do homem, mas isto não implica, de forma alguma, a negação de que se deva levar em conta a contribuição que consciente e voluntariamente o homem tem trazido à organização da ordem estatal”.

E mais, segue o autor explicando que: [4]

“O Direito é, essencialmente, ordem das relações sociais segundo um sistema de valores reconhecido como superior aos indivíduos e aos grupos. Os valores sobre que se fundamenta o mundo jurídico são de duas espécies: uns são primordiais, ou melhor, conaturais ao ser humano, tal como o valor da pessoa humana, que é o valor-fonte da idéia do justo, outros são valores adquiridos por meio da experiência histórica, ao passo que os primeiros são pressupostos dos ordenamentos jurídicos ainda quando estes os ignoram”.

Neste mesmo sentido, para Julio Fabbrini Mirabete[5]:

“Uma das tarefas essenciais do Estado é regular a conduta dos cidadãos por meio de normas objetivas sem as quais a vida em sociedade seria praticamente impossível. São assim estabelecidas regras para regulamentar a convivência entre as pessoas e as relações destas com o próprio Estado, impondo aos seus destinatários determinados deveres, genéricos e concretos aos quais correspondem os respectivos direitos ou poderes das demais pessoas ou do Estado”.

Verifica-se, desta maneira, a importância das diretrizes apontadas pelo Estado para a organização da sociedade. Segundo Darcy Azambuja: [6]

“Comecemos por acentuar os traços e atributos fundamentais do Estado. É uma sociedade natural, no sentido de que decorre naturalmente o fato de os homens viverem necessariamente em sociedade e de aspirarem naturalmente realizar o bem geral que lhes é próprio, isto é, o bem público. Por isso, e para isso, a sociedade se organiza em Estado”.

Selecionando como referência de enfoque o ordenamento jurídico brasileiro, verifica-se que as diretrizes primordiais são elencadas pela Constituição Federal de 1988, a Lei Maior vigente.

A partir dos parâmetros constitucionais, há desdobramentos para as diversas ramificações, áreas específicas do Direito. Cumpre destacar, ainda, que o Direito é uno, e é fracionado, segregado para fins didáticos.

A ramificação do Direito, desta maneira, é importante para apresentar as peculiaridades de cada ramo que o compõem, e para apresentar as tutelas adequadas aos casos concretos.

 Para José Afonso da Silva[7]:

“O Direito é fenômeno histórico-cultural, realidade ordenada, ou ordenação normativa da conduta segundo uma conexão de sentido. Consiste num sistema normativo. Como tal, pode ser estudado por unidades estruturais que o compõem, sem perder de vista a totalidade de suas manifestações. Essas unidades estruturais ou dogmáticas do sistema jurídico constituem as divisões do Direito, que a doutrina denomina ramos da ciência jurídica, comportando subdivisões”.

Frente à conscientização da presença dos conflitos, e, conseqüentemente, das divergências existentes entre as partes, a legislação brasileira proíbe a sistemática da justiça feita com as próprias mãos. Neste sentido, há previsão expressa do artigo 345, do Código Penal brasileiro, acerca desta conduta[8]:

“Exercício arbitrário das próprias razões:

Art. 345 – Fazer justiça pelas próprias mãos, para satisfazer pretensão, embora legítima, salvo quando a lei o permite:

Pena – detenção, de quinze dias a um mês, ou multa, além da pena correspondente à violência.

 Parágrafo único – se não há emprego de violência, somente se procede mediante queixa”.

Isto significa que a autotutela é vedada no Brasil. Sendo assim, faz-se necessário verificar que há diversos modos de resolução para os conflitos presentes na sociedade.

Para tanto, é imprescindível esclarecer que uma via é a busca pela solução do conflito no Poder Judiciário. O acesso à via judiciária, para a verificação da lide encontra-se consagrado constitucionalmente, previsto no artigo 5°, inciso XXXV, da Lei Magna brasileira vigente. Ocorre que esta via se encontra cada vez mais sobrecarregada, por conta das inúmeras demandas apresentadas para a análise e julgamento dos juízes.

A demora para a obtenção de uma resposta, para a solução da divergência entre as partes é muito angustiante. Ademais, a Lei Maior vigente consagra também, em seu artigo 5°, inciso LXXVIII, o princípio da razoável duração do processo.

Apesar dos esforços empregados pela sociedade, membros da Magistratura, e resoluções do Conselho Nacional de Justiça, é vital a busca por meios alternativos para a solução dos conflitos e embates existentes entre as partes.

Neste contexto, os institutos da conciliação, mediação e arbitragem merecem destaque.

Nas lições de Luiz Fernando do Vale de Almeida Guilherme:[9]

“Os problemas que o Judiciário brasileiro enfrenta não são de exclusividade deste país, tendo em vista que a tendência atual mundial é a de que o instituto da arbitragem venha, cada vez mais, a ganhar espaço na prática das relações jurídicas, tanto no âmbito do direito interno como no direito internacional”.  

Neste mesmo sentido, entendem Antônio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco que[10] :

“Abrem-se os olhos agora, todavia, para todas essas soluções não-jurisdicionais dos conflitos, tratadas como meios alternativos de pacificação social. Vai ganhando corpo a consciência de que o que importa é pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do Estado ou por outros meios, desde que eficientes.”

Os institutos supracitados apresentam semelhanças e também peculiaridades. O presente artigo se foca na importância da arbitragem, no ordenamento jurídico brasileiro. A arbitragem é um dos meios de acesso à justiça, portanto, merece destaque por sua importância fundamental para o exercício da cidadania.

2) Conflitos sociais e a importância da atuação do Poder Judiciário

O primeiro tópico do presente artigo delineou uma breve explanação sobre o contexto da relação entre os seres humanos, o Direito e a sociedade.

O ordenamento jurídico busca apresentar as normas de organização social. Este corpo de normas apresenta as diretrizes que devem ser adotadas como um norte, um parâmetro pelos homens, na busca por um equilíbrio na sociedade.

É evidente, portanto, a importância de um corpo normativo, um conjunto de leis para apresentar as condutas aceitas e rejeitadas pela sociedade, com a finalidade de proteção dos homens.   

Neste sentido, esclarece Dalmo de Abreu Dallari que: [11]

“Não basta uma reunião de pessoas para que se tenha por constituída uma sociedade, sendo indispensável, entre outras coisas, que essas pessoas se tenham agrupado em vista de uma finalidade. E, quanto à sociedade humana, que é a reunião de todos os homens e que, portanto, deve objetivar o bem de todos, a finalidade é o bem comum.

Entretanto, é evidente que o simples agrupamento de pessoas, com uma finalidade comum a ser atingida não seria suficiente para assegurar a consecução do objetivo almejado, sendo indispensável que os componentes da sociedade passem a se manifestar em conjunto, sempre visando àquele fim”.

Em prosseguimento, entende o autor que: [12]

“Mas, para assegurar a orientação das manifestações num determinado sentido e para que se obtenha uma ação harmônica dos membros da sociedade, preservando-se a liberdade de todos, é preciso que a ação conjunta seja ordenada.”

Ocorre que, apesar de todo o corpo de normas que dispõem as diretrizes a serem seguidas, com a busca pela convivência pacífica, por vezes, existem conflitos entre as pessoas.

Estes decorrem de diversas razões. O convívio social faz surgir uma série de pretensões que podem ou não ser concretizadas. Ao encontrar resistência às necessidades ou aos desejos, os seres humanos podem reagir de diversas maneiras, principalmente persistindo na busca por sua concretização ou desistindo destes objetivos.

Cumpre destacar que existem diversas formas de pacificação e solução dos litígios, como forma de remediar a situação de confronto entre as partes.

Tais técnicas de evolução acompanham o desenvolvimento da sociedade. Com a maior complexidade da sociedade, houve aumento de conflitos entre os membros desta.

Naturalmente, este desenvolvimento dos meios de solução dos conflitos não apresenta um desenvolvimento linear. Os avanços e os retrocessos fazem parte do processo de concretização dos meios de pacificação entre os conflitantes.

A Constituição Federal brasileira apresenta uma série de mecanismos para a defesa dos direitos constitucionalmente consagrados. Os meios mais utilizados são a via do Poder Judiciário e a via administrativa. Cumpre esclarecer que um caminho não exclui o outro.

Ocorre que o aumento da demanda dos litígios surgiu, e, com ele, a necessidade de outros meios para a pacificação social. Vale dizer, com as relações sociais em grau de complexidade mais amplo, deve haver novas configurações para a resolução dos conflitos.

Uma das maneiras de se buscar esta resolução ocorre com a provocação e intervenção do Poder Judiciário, acarretado pela iniciativa das partes.

Conforme previamente abordado, verifica-se que no ordenamento jurídico brasileiro, a Constituição Federal vigente, em seu artigo 5°, elenca uma série de direitos e deveres individuais e coletivos.

O inciso XXXV do referido artigo consagra que “a lei não excluirá do Poder Judiciário lesão ou ameaça de lesão a direito”. E mais, o inciso LXXVIII estampa o princípio da razoável duração do processo.

Os artigos 92 e seguintes, da Magna Carta brasileira vigente, apresentam a estrutura do Poder Judiciário. Deve ser feito um estudo em conjunto, entre as normas constitucionais e as normas consagradas no Código de Processo Civil brasileiro.

O processo civil brasileiro apresenta, portanto, uma estrutura que emana das diretrizes constitucionais.

Quando surge o conflito entre as partes, o autor da ação que opte pela via judicial deve observar uma série de regras estabelecidas, como, por exemplo, a competência territorial e a competência material. Não cabe às partes a escolha acerca do procedimento a ser adotado, do julgador da lide, e nem da Vara em que tramitará o processo. Os prazos processuais também devem ser rigorosamente observados e cumpridos.

Ocorre que esta via se encontra cada vez mais sobrecarregada. Cada vez mais os envolvidos no conflito recorrem ao Judiciário. Desta forma, são necessários outros meios para a pacificação social.

Dentre os meios de pacificação supracitados, destaca-se a arbitragem, como meio alternativo na solução de conflitos. Este instituto jurídico já existe no ordenamento jurídico brasileiro há muitos anos, porém, não há divulgação necessária a respeito de seus benefícios e da segurança proporcionada.

Insta salientar que há uma série de diferenças entre a resolução de um conflito pela via judicial e pela arbitragem, que serão a seguir apresentados.

Carlos Alberto Carmona apresenta a definição e o conceito de arbitragem: [13]

“A arbitragem – meio alternativo de solução de controvérsias através da intervenção de uma ou mais pessoas que recebem seus poderes de uma convenção privada, decidindo com base nela, sem intervenção estatal, sendo a decisão destinada a assumir a mesma eficácia da sentença judicial – é colocada à disposição de quem quer que seja, para a solução de conflitos relativos a direitos patrimoniais acerca dos quais os litigantes possam dispor. Trata-se de mecanismo privado de solução de litígios, por meio do qual um terceiro, escolhido pelos litigantes, impõe sua decisão, que deverá ser cumprida pelas partes”.

É imprescindível verificar que a arbitragem é um meio privado de solução de conflitos. Por esta razão, é possível a sistemática de amplitude de escolhas, que as partes possuem, e que difere do processo civil.

3) Arbitragem no ordenamento jurídico brasileiro

A Lei que regulamenta a arbitragem foi promulgada em 1996 (Lei n°. 9.307/96). É composta por sete capítulos e quarenta e quatro artigos. O capítulo I apresenta suas disposições gerais, e esclarece quem pode se submeter à arbitragem, bem como quais são os seus limites. O capítulo seguinte dispõe sobre a convenção de arbitragem e seus efeitos. O capítulo III apresenta as normas a respeito dos árbitros. Em seguida, o capítulo IV estabelece as regras sobre o procedimento arbitral. O próximo capítulo trata da sentença arbitral. A seguir, estão expressas as normas referentes ao reconhecimento e execução de sentenças arbitrais estrangeiras. O capítulo VII apresenta as disposições finais. Seguindo as diretrizes apontadas no artigo 10, da referida Lei, há um rol de elementos que devem obrigatoriamente estar presentes, no compromisso arbitral, sob pena de nulidade do procedimento.  

Nos dizeres de Carlos Alberto Carmona: [14]

“Exige a lei vigente à qualificação das partes (incluindo estado civil, que pode ser relevante para aferir a necessidade de participação do cônjuge mo juízo arbitral, na hipótese de versar o litígio sobre bens imóveis, por exemplo), a qualificação dos árbitros ou a especificação da entidade que os indicará (o que, desde logo, demonstra que as partes poderão delegar a um órgão especializado ou não em arbitragem a indicação de árbitros), a matéria que será objeto da arbitragem e o lugar em que será proferida a sentença arbitral”.

A arbitragem, apesar de também visar à pacificação social, com a resolução do conflito, difere da busca pela via do Poder Judiciário. É necessário elencar e apontar o que a difere da solução judicial do conflito.

Conforme anteriormente explanado, a arbitragem é um mecanismo de solução de conflitos privado. Isto significa que não há participação do Estado neste procedimento. Trata-se, desta forma, de uma opção das partes, e não uma imposição. Emana da vontade destas, e é pautada pela livre convenção.

A opção pela arbitragem encontra-se vinculada a dois limites, previstos em lei: participação de pessoas capazes, e direitos disponíveis.

A arbitragem ocorre nas Câmaras de Arbitragem. Cumpre destacar novamente que esta esfera privada de solução de conflitos difere da esfera do Poder Judiciário, por inúmeros aspectos.

A lei de arbitragem estabelece que este procedimento decorre da escolha, da opção das partes, que elegem o árbitro, o foro, a Câmara e os procedimentos a serem adotados e aplicados.

Quanto ao julgamento, esclarece o artigo 2°, da Lei n°. 9.307/06, que este pode ser pautado tanto pelas normas de Direito quanto pela equidade. A escolha para a aplicação das normas, ou da equidade, decorre da vontade das partes.

Esta forma de resolução de litígios encontra-se estritamente vinculada à confiança que as partes possuem no árbitro.

Para a análise da sistemática deste procedimento de solução de conflitos, é imprescindível a observação da Lei n°. 9.307/96, que apresenta as normas sobre a arbitragem.

Os envolvidos no litígio exercem as opções através da consagração e estipulação da convenção de arbitragem, que se desdobra em cláusula compromissória e compromisso arbitral, previstas no artigo 4°, da Lei n°. 9.307/96. É importante diferenciá-las.

Enquanto a primeira (cláusula compromissória), é estipulada no contrato antes da existência da lide, onde as partes já elegem este meio de solução de conflitos, a segunda (o compromisso arbitral), é o termo estipulado entre as partes após a ocorrência do conflito. O que as difere, portanto, é o momento de sua estipulação.

Insta salientar que a cláusula compromissória pode ser cheia (quando há previsão prévia de todos os itens), ou vazia (quando apenas se opta pela arbitragem, sem apresentar detalhes sobre o procedimento arbitral).

Neste caso, quando a cláusula compromissória for vazia, e efetivamente ocorrendo o conflito, é necessário o compromisso arbitral.

A arbitragem difere da busca pela tutela dos direitos pela via judicial, pois as partes, na primeira situação, possuem a opção de escolha.

Conforme abordado previamente, cabe aos envolvidos no litígio a escolha da Câmara Arbitral, dos árbitros, do procedimento aplicado, prazos e das normas  elencadas.

Cumpre destacar que a Lei n°. 9.307/96 estabelece, em seu artigo 13, que pode ser árbitro qualquer pessoa capaz, e que seja de confiança das partes.

A Lei não determina desta forma que o árbitro deva possuir formação jurídica.

Naturalmente, tanto o árbitro escolhido pelas partes que não possua formação jurídica, como os envolvidos no litígio devem contar com o respaldo legal, para a resolução da lide.

O árbitro possui diversos poderes similares aos poderes pertencentes aos juízes de Direito. Neste sentido, merece destaque o artigo 18, da Lei n°. 9.307/96. Segundo o referido artigo, o árbitro é juiz de fato e de direito. A exceção é o poder de coerção, que os magistrados possuem, e os árbitros, não.

Desta maneira, caso em algum momento, na Câmara de Arbitragem, seja necessária a coerção, este pedido deve ser formulado frente ao Poder Judiciário. Verifica-se, desta maneira, a relevância do árbitro, para a pacificação dos litígios.

Portanto, é importante apresentar o conceito de árbitro, definido na obra Vocabulário Jurídico, por De Plácido e Silva [15]:

“Árbitro. Assim se diz da pessoa que é escolhida pelas partes, em face de um compromisso assumido, para tomar parte no juízo arbitral e dirigir a arbitragem.

Segundo as regras instituídas, somente pode ser árbitro quem tenha capacidade plena, e mereça a confiança das partes.

Os incapazes, analfabetos, os impedidos e suspeitos estão vedados de serem investidos na função arbitral.

A louvação em árbitros, ou seja, a nomeação deles pelas partes constará de um compromisso escrito, compromisso este que tanto pode ser judicial quanto extrajudicial.

Instituído o juízo arbitral, devem os árbitros declarar se aceitam a incumbência, presumindo-se recusa a falta de resposta à interpelação que lhes fizer.

Equiparado ao juiz, o árbitro é passível de suspeição, nas mesmas circunstâncias em que o juiz o é”.

No decorrer desta explanação, verifica-se que a figura do árbitro é de extrema valia, para a busca da pacificação social.

Ocorre que o instituto da arbitragem, bem como seus benefícios para a sociedade, não são amplamente divulgados, principalmente em cursos que não sejam da área jurídica.

Desta forma, é importante a divulgação do referido instituto para as pessoas que não possuam formação jurídica também.

Desta maneira, inúmeros conflitos podem ser solucionados frente a este instituto, com o auxílio e atuação dos árbitros escolhidos e nomeados pelas partes litigantes, sempre estando presente a relação de confiança entre as partes e estes. É importante apresentar esta informação para as pessoas, com o intuito de conscientizá-las da existência desta realidade, bem como capacitá-las para poderem atuar como árbitros.

Nos dizeres de Carlos Alberto Carmona: [16]

“Quanto à nomeação de árbitros, cabem, desde já, algumas observações que parecem relevantes: o inciso II do art. 10 permite que as partes deleguem a uma entidade a função de indicar árbitro ou árbitros. A fim de respeitar ao máximo a vontade das partes, não se exige que a entidade delegada seja um órgão arbitral institucional. Podem as partes convencionar que a Ordem dos Advogados do Brasil, o Conselho Regional de Economia ou a diretoria da Faculdade de Engenharia da USP indique os árbitros.”

O árbitro deve, assim como o magistrado, atuar com imparcialidade, na busca pela pacificação do conflito. Quanto aos princípios que regem o procedimento arbitral, entende o autor supracitado que: [17]

“Restam fortalecidos os princípios básicos do devido processo legal, ao mesmo tempo em que a autonomia da vontade foi prestigiada na medida em que fica a critério das partes a disciplina procedimental da arbitragem. A regra preconizada é a seguinte: as partes podem adotar o procedimento que bem entenderem desde que respeitem os princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro, e do seu convencimento racional. Se nada dispuserem sobre o procedimento a ser adotado e se não se reportarem a regras de algum órgão institucional, caberá ao árbitro ou ao tribunal arbitral ditar as normas a serem seguidas, sempre atendidos os princípios há pouco mencionados, princípios esses que, em última análise, resumem o conteúdo do que, historicamente, acabou sendo conhecido como o devido processo legal”.

A lei de arbitragem apresenta um leque amplo de escolha para as partes envolvidas. Merece destaque o artigo 13, da Lei n°. 9.307/96. Isto porque o referido artigo estabelece que qualquer pessoa capaz poderá ser árbitra.

E mais, estabelece o artigo supracitado que além da capacidade, deve haver a relação de confiança entre as partes e o árbitro.

Desta forma, as mais diversas habilidades técnicas podem ser empregadas, na busca pela solução de conflitos, bem como pela pacificação social. A amplitude de escolha na busca por profissionais preparados para as mais diversas situações de conflitos é de imensurável valia para a sociedade.

Não só advogados podem atuar como árbitros, mas, sim, todos os capazes, e que contem com a relação de confiança com as partes, proporcionando a pacificação entre as partes.

A arbitragem, adotando esta sistemática, prestigia a participação de profissionais de diversas áreas na tarefa de apaziguar as partes.

As contribuições trazidas por profissionais de diversas áreas consagram uma experiência enriquecedora para a sociedade. Afinal, conflitos existem em todas as áreas, não apenas no universo jurídico. O respaldo jurídico é indispensável, mas, nem sempre o foco do conflito ocorre no universo jurídico.

O Direito apresenta meios para que as pessoas defendam seus direitos. Cumpre ressaltar que as lesões a estes ocorrem nas mais diversas esferas e situações. Conforme anteriormente exposto, as partes podem escolher a câmara arbitral mais adequada para a solução do litígio.

A escolha engloba diversos critérios, como a complexidade da causa, e a qualificação, o preparo, experiência e formação dos árbitros.

Os conflitos podem ser submetidos a este meio alternativo de solução de litígios independente de sua complexidade. 

Insta salientar novamente que apesar de as partes terem a opção de selecionarem um árbitro sem a formação jurídica, naturalmente, as câmaras de arbitragem, bem como as partes, deverão sempre haver amparo e respaldo jurídico.

A arbitragem apresenta diversas vantagens, apesar de ainda não ser amplamente divulgado. Elenquemos, por exemplo, a rapidez na solução dos conflitos, bem como a estabilidade e segurança jurídica.

Outro aspecto relevante, que merece destaque, é a sentença arbitral, prevista nos artigos 23 e seguintes, da Lei de Arbitragem (Lei n°. 9.307/96).

Trata-se de sentença autônoma, consubstanciada em documento escrito que não precisa de homologação judicial. A sentença arbitral faz coisa julgada, portanto, garante estabilidade da decisão às partes.

Outro aspecto importante a ser retomado é o fato de que o julgamento, pela arbitragem, pode não se pautar apenas na lei.

Pode se basear, também, na equidade, desde que seja esta a escolha das partes.

Naturalmente, a equidade, que busca a verdade dos fatos, deve respeitar as normas de ordem pública e aos bons costumes, sob pena de nulidade no caso de desrespeito a estes.

Portanto, a amplitude da liberdade que abrange esta forma privada de solução dos conflitos não pode esbarrar nestas nem atingi-las.  

Quanto ao procedimento arbitral, previsto no Capítulo IV, artigos 19 e seguintes, da Lei de arbitragem, é importante destacar que esta seguirá as diretrizes dos procedimentos escolhidos pelas partes.

Este método de solução de conflitos apresenta, inclusive, maior rapidez frente ao Poder Judiciário, pois seu sistema não comporta a utilização de recursos.

É necessário esclarecer que o artigo 30, da Lei 9.307/96 prevê prazo de cinco dias para que o interessado, mediante comunicação da outra parte, solicite ao árbitro ou ao Tribunal Arbitral a correção de erro material apresentado na sentença, ou que esclareça algum aspecto que seja obscuro, contraditório ou omisso. O limite ao sistema recursal é muito restrito, como se pode verificar.

Deve-se frisar que o sistema recursal previsto constitucionalmente, e aplicado nos litígios submetidos à análise da via judicial é de imensurável valia, como meio de correção de equívocos cometidos.

Ocorre que, por vezes, os mesmos são utilizados com o escopo de protelar a extinção da lide.

Através do destaque da arbitragem como forma de pacificação social, constata-se que o Poder Judiciário não é o único meio a ser utilizado para a resolução de conflitos.

Com a nova realidade apresentada, há necessidade da busca por novos meios para a solução dos problemas e das demandas da sociedade. Neste sentido, a função da arbitragem vem apresentando cada vez mais eficácia na busca pela resolução dos conflitos.

Deve-se observar a importância da divulgação das informações a respeito dos benefícios da arbitragem, não só para os profissionais que possam vir a atuar como árbitros, mas também, para os litigantes.

A estabilidade proporcionada pela sentença arbitral, e a rapidez na resolução dos litígios (inclusive pela incompatibilidade da arbitragem com a interposição dos recursos) apresentam inúmeros benefícios para todos os envolvidos na lide, bem como para a sociedade.

4) Considerações Finais

A organização dos seres humanos, na vida estruturada em sociedade, encontra-se relacionada com a organização apresentada pelo ordenamento jurídico.

Afinal, o Direito apresenta as normas para a pacificação dos homens, no convívio social.

O presente artigo apresentou como foco a legislação brasileira na busca pela solução de conflitos dos membros que compõem a sociedade.

A partir do momento em que é tipificado como crime a autotutela, a justiça feita com as próprias mãos, o Estado mostra-se como um canal para dirimir os litígios.

A busca pelo Poder Judiciário na consagração da pacificação social vem sendo muito utilizada pela população.

Existe, também, a via administrativa que é amplamente utilizada, na luta pela resolução dos problemas, e na busca pela consagração dos direitos.

O ingresso na via administrativa não exclui a busca pela decisão da questão, pelo meio judicial, caso a primeira não seja eficaz no caso concreto, e não consiga dirimir o conflito. 

Ocorre que esta busca da população pelo Poder Judiciário acabou por sobrecarregar a via judicial.

Em que pese o envolvimento e a dedicação dos magistrados, na nobre missão de aplicarem o Direito na solução dos casos concretos apresentados, a demora para a decisão acerca do conflito mostra-se muito prejudicial e angustiante para as partes.

Desta forma, deve-se buscar respaldo também em outras vias, para a extinção do conflito entre as partes.

Há diversos meios alternativos para a análise e a solução dos litígios.

Dentre elas, a arbitragem merece destaque.

Tipificada no ordenamento jurídico brasileiro, pela Lei n°. 9.307/96, é um meio privado de solução de conflitos entre os envolvidos.

 Difere da estrutura apresentada pelo Poder Judiciário, pois a arbitragem é um meio de solução de conflitos em que as partes possuem a oportunidade de escolha dos árbitros (julgadores do caso), do procedimento, Câmara Arbitral, prazos e normas a serem aplicadas as caso apresentado.

Ao contrário, quando as partes optam pela análise de seu conflito pela via judicial, elas devem estar cientes de que os procedimentos adotados para a verificação deste emanam de normas constitucionais e processuais.

Na estrutura do Poder Judiciário, não cabe às partes a escolha do magistrado que irá julgar o conflito, nem a adoção de prazos processuais diversos dos estabelecidos em lei. As partes também não podem optar pelo procedimento que será adotado.

Os operadores do direito que representam as partes devem seguir as normas elencadas no Código de Processo Civil.

A arbitragem apresenta como uma de suas vantagens a livre convenção a ser adotada pelas partes, e aplicada pelo árbitro no caso concreto.

Os limites à ampla escolha das partes esbarram na proteção à ordem pública e aos bons costumes.

Outra restrição à utilização desta via é a incapacidade das partes, bem como os direitos indisponíveis.

Desta forma, portanto, a arbitragem apresenta larga amplitude de escolha para os envolvidos, porém, são vedadas escolhas que firam a ordem pública, os bons costumes, que atinjam direitos indisponíveis e pessoas incapazes.

Insta salientar que a relação entre as partes envolvidas no conflito e o árbitro é de confiança.

A Lei n°. 9.307/96 não exige em momento algum que o árbitro possua formação jurídica.

Ressalte-se novamente que a Lei supracitada destaca é a importância da confiança das partes com o árbitro.

Naturalmente, mesmo que as partes optem por um árbitro que não possua formação jurídica, tanto este profissional quanto os litigantes deverão contar com todo o apoio e respaldo jurídico, na Câmara Arbitral.

Cumpre destacar que a sentença arbitral faz coisa julgada, portanto, garante para as partes a estabilidade da decisão, como forma de proteção dos direitos dos envolvidos na lide.

Quanto aos poderes do árbitro, que, frente à condução e aplicação do procedimento arbitral, atua como verdadeiro pacificador social, estes (os poderes) são muito similares aos conferidos para os magistrados.

Entretanto, não há, no instituto da arbitragem, a previsão do poder de coerção. Caso esta seja necessária, deve haver o respaldo do Poder Judiciário, para a sua determinação e cumprimento.

Verifica-se, desta maneira, a conjunção dos esforços destas duas vias para a pacificação social.

Portanto, a divulgação sobre a importância da arbitragem e o esclarecimento a respeito de seu procedimento é de extrema relevância para as pessoas.

Ora, inúmeros profissionais de diversas áreas podem atuar na arbitragem, trazendo contribuições valiosíssimas para a sociedade.

Afinal, o ordenamento jurídico apresenta um corpo de normas que visam salvaguardar os direitos das pessoas.

Mas é importante frisar que os conflitos ocorrem em diversas áreas. Não se encontram concentrados apenas no âmbito jurídico.

Este processo de informação sobre os benefícios da arbitragem, para a pacificação dos conflitos, deve abranger todos, abarcando também, aos que não possuam formação jurídica.

As informações sobre a existência do referido instituto, bem como se sua sistemática e seus princípios devem ser apresentados para que as pessoas tenham ciência da importância da arbitragem na sociedade, na busca pela pacificação entre as partes e a resolução dos litígios.

Desta forma, com o envolvimento de profissionais de diversos setores, e as informações prestadas também aos litigantes, a arbitragem apresenta função primordial na busca pelo equilíbrio entre as pretensões apresentadas pelas partes para se tornar um mecanismo muito eficiente para a pacificação social, e para a solução dos conflitos.

5) Referências

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DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24 ed. São Paulo, Editora Saraiva. 2003.

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SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 23 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003.

SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2003.



[1] Maria Fernanda Soares Macedo. Advogada. Mestra em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Professora Universitária. Professora Convidada dos Cursos de Pós Graduação em Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie e das Faculdades Metropolitanas Unidas. Professora orientadora de monografias dos cursos de Pós Graduação do Complexo Educacional Damásio de Jesus. Professora de Direito em cursos de ensino à distância.

[2] SANTOS, Marcelo Fausto Figueiredo. Teoria Geral do Estado. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2001. p. 25.

[3] REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 5ª ed.São Paulo: Saraiva, 2000. p. 09.

[4] REALE, Miguel. Teoria do Direito e do Estado. 5ª ed.São Paulo: Saraiva, 2000. p. 09.

[5] MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 18 ed. São Paulo: Atlas, 2007. p.04.

[6] AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. 2ª ed. Editora Globo: São Paulo, 2008. p.19.

[7] SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2003. p. 33

[8] Artigo 345, do Código Penal brasileiro – Decreto-Lei n°. 2.848, de 07 de dezembro de 1940.

[9] GUILHERME, Luiz Fernando do Vale de Almeida. Manual de arbitragem: doutrina – legislação – jurisprudência. 2 ed. São Paulo: Método, 2007. p. 146.

[10] CINTRA, Antonio Carlos, DINAMARCO, Cândido Rangel, GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 20.ed. São Paulo: Malheiros, 2004.p.25 e 26.

[11] DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. 24 ed. São Paulo, Editora Saraiva. 2003. p.25.

[12] Ibidem.

[13] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem  e Processo um comentário à Lei n°. 9.307/96.. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.31.

[14] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem  e Processo um comentário à Lei n°. 9.307/96.. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.19.

[15] SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 23 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2003. p. 131.

[16] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem  e Processo um comentário à Lei n°. 9.307/96.. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.19.

[17] CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem  e Processo um comentário à Lei n°. 9.307/96.. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2009. p.23.

Como citar e referenciar este artigo:
MACEDO, Maria Fernanda Soares. Arbitragem: a importância de sua divulgação como meio de auxílio à sociedade, garantia de acesso à justiça e cidadania. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2015. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-civil/arbitragem-a-importancia-de-sua-divulgacao-como-meio-de-auxilio-a-sociedade-garantia-de-acesso-a-justica-e-cidadania/ Acesso em: 16 abr. 2024