Direito Ambiental

A aplicação efetiva do Código Florestal Brasileiro e a eficiência no combate ao desmatamento da Floresta Amazônica como instrumentos de redução do aquecimento global no século XXI

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Lucas de Cássio Cunha Aranha[1]

RESUMO

Observa-se uma relação no que tange à aplicação do que está previsto no Código Florestal Brasileiro e a eficiência no combate ao desmatamento da Floresta Amazônica na primeira década do século XXI, haja vista que até o ano de 2004 o índice de quilômetros quadrados desmatados mostrava-se ascendente; no entanto, devido a determinados fatores – como a aplicação da legislação florestal –, esse índice passou a decrescer, atingindo o menor percentual que já fora registrado. A Amazônia é a floresta de clima equatorial mais importante do mundo, uma vez que apresenta grande variedade vegetal, animal e mineral. Como a maior parte desta encontra-se em território brasileiro, este tem maior responsabilidade e dever de sua preservação, sobretudo de forma a pensar e agir sustentavelmente, tendo em vista que dentre outros fatores, a preservação ambiental influi diretamente no processo de agravamento do efeito estufa. Ademais, destaca-se que a atuação convergente dos poderes legislativo, executivo e judiciário foi um dos principais fatores responsáveis pela redução do desmatamento na floresta, o que demonstraremos neste trabalho, fazendo uso de dados obtidos por pesquisas e análises.

Palavras-chave: Floresta Amazônica. Desmatamento. Código Florestal Brasileiro. Aquecimento Global. Desenvolvimento Sustentável.

1 INTRODUÇÃO

A Amazônia é a maior floresta em quilômetros quadrados de clima equatorial do mundo. Presente em oito dos treze países Sul-americanos – Brasil, Suriname, Venezuela, Guiana, Colômbia, Equador, Peru, Bolívia e Guiana Francesa –, 64% de sua área total encontra-se dentro do Brasil (CERQUEIRA, 2011). Como é um patrimônio pertencente a todos, é essencial que esta seja preservada, sobretudo pensando-se na presente e futuras gerações. Contudo, segundo Ane Alencar (2012), “até o ano de 2004, pelo menos 587.000 km² da floresta amazônica foram desmatados para dar lugar a atividades como a pecuária, a agricultura ou até mesmo para construção de estradas e a extração ilegal de madeira”. Outrossim, dados levantados pelo Governo Federal revelaram que após o ano de 2004, houve uma redução na taxa de desmatamento.

Diante de tais constatações, questiona-se: seria tal redução do desmatamento causada pela aplicação do Código Florestal Brasileiro, por uma ação conjunta dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário ou ocorrida de forma espontânea? É importante entender quais fatores contribuíram para essa redução do desmatamento da Amazônia e o que possibilitou a ação convergente destes.

Esse tema – pouco trabalhado –, tornou-se objeto do presente trabalho devido a sua atualidade e pertinência. É notório o interesse que deve a população ter sobre tal temática, haja vista sua ligação direta com a sociedade, uma vez que a Floresta Amazônica é um bem pertencente, não só todos os brasileiros, mas também para todos os habitantes do planeta Terra, além de ser intimamente ligado ao processo de redução de gases do efeito estufa.

“A floresta Amazônica representa um terço das florestas […] do mundo, além de conter mais da metade da biodiversidade do planeta. O desmatamento na região representa hoje a liberação de 200 milhões de toneladas de carbono por ano […]” (AZEVEDO, 2010). O desmatamento da floresta amazônica, quando causado por queimadas, influencia no aumento do aquecimento global, que não prejudica somente aqueles que vivem na Amazônia ou no Brasil, mas o planeta Terra, de modo geral.

Dentre os objetivos desta pesquisa, estão: descrever como a aplicação do que está previsto no Código Florestal Brasileiro ajudou a reduzir a taxa do desmatamento na Floresta Amazônica; apontar os demais fatores responsáveis por essa redução; identificar a contribuição dos poderes legislativo, executivo e judiciário do Brasil nesse processo; demonstrar como o cumprimento do Código Florestal também pode contribuir para a redução do aquecimento global.

A pesquisa realizada neste trabalho é classificada como exploratória e o procedimento, bibliográfico, haja vista as poucas produções científicas existentes sobre o tema, além de sua elaboração ter como base a consulta e análise de dados fornecidos pelo Ministério do Meio Ambiente, pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais e por pesquisadores, assim como leis e decretos que envolvem o Código Florestal Brasileiro para, através do estabelecimento de uma relação entre esses fatores, chegar às conclusões que explicarão o porquê da redução do desmatamento da Amazônia e a sua relação com a aplicação efetiva das leis florestais.

Quanto à metodologia, foi feita a opção pelo método dedutivo, pois a partir da aplicação do que está previsto no Código Florestal Brasileiro é possível prever a redução do desmatamento na Amazônia.

2 EXPLORANDO A AMAZÔNIA

2.1 A FLORESTA BRASILEIRA

A Amazônia é uma das florestas mais importantes do mundo, devido a sua extensão e grande biodiversidade animal, vegetal, fúngica e mineral.

[…]está presente em oito países da América do Sul: Brasil, Suriname, Venezuela, Guiana, Colômbia, Equador, Peru e Bolívia, além do território da Guiana Francesa. Essa floresta tinha extensão superior a 5 milhões de quilômetros quadrados. Porém, o intenso processo de desmatamento tem reduzido a área original de forma drástica(CERQUEIRA, 2011). 

Quanto à biodiversidade, segundo dados presentes no site do Prêmio Márcio Ayres para Jovens Naturalistas, “A riqueza da flora compreende aproximadamente 30.000 espécies, cerca de 10% das plantas de todo o planeta. São cerca de 5.000 espécies de árvores (maiores que 15cm de diâmetro), enquanto na América do Norte existem cerca de 650 espécies de árvores. A diversidade de árvores varia entre 40 e 300 espécies diferentes por hectare, enquanto na América do Norte varia entre 4 a 25”. Além disso, há uma significativa diversidade animal, composta por espécies de artrópodes, peixes, anfíbios, répteis, aves, além dos mamíferos, em que são registrados atualmente mais 311 espécies, incluindo primatas, quirópteros e roedores.

A maior parte da floresta Amazônica está no território brasileiro (Mapa 1).

A Amazônia Legal (parte da floresta localizada em território brasileiro) corresponde a 64% de toda a floresta Amazônica. O país é um dos grandes responsáveis pela destruição da floresta, os estados onde mais se desmata são: Pará, Mato Grosso, Amazonas, Rondônia e Maranhão. Mediante esse cenário de destruição, medidas de preservação devem ser realizadas urgentemente (CERQUEIRA, 2011).

Mapa 1 – Extensão da Amazônia Internacional

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Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/img/geral/mapa-veja-05.jpg

Como a maior parte da Floresta Amazônica se encontra em território brasileiro, é obrigação deste zelar por sua preservação e consequentemente reduzir o seu desmatamento, uma vez que a Amazônia é importante não só para os brasileiros, mas para todos os habitantes do planeta Terra. Vale ressaltar que a floresta é de corresponsabilidade sustentável de todos, conforme direito e deveres dispostos no art. 225 da Constituição da República Federativa do Brasil (1988):

Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

§1° Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:

I – preservar, e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;

[…]

III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através da lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;

[…]

A efetivação desses deveres e incumbências constitucionais do poder público podem ser observadas através das legislações ambientais, sobretudo do Código Florestal Brasileiro, de 2012.

Outrossim, é importante que se note que a influência da Amazônia não está em escala local, mas sim global, tendo em vista que está é um rico e um dos mais importantes ecossistemas, responsável pelo equilíbrio climático que ameniza as elevadas temperaturas da região equatorial e aumenta a quantidade de oxigênio, devido à realização da fotossíntese por parte das suas árvores.

2.2 A QUESTÃO DA INTERNACIONALIZAÇÃO

A internacionalização da Floresta Amazônica foi uma questão levantada pelos países desenvolvidos que acusavam o Brasil de não cuidar da Amazônia de forma que sua preservação fosse assegurada. A maioria dos brasileiros é contra esta internacionalização. Tal questão teve maior evidência durante a década de 1990, período no qual a Amazônia era desmatada sem que houvesse a mínima preocupação com a preservação dela e líderes e órgãos internacionais colocaram-se a favor que floresta deixasse de ser administrada por brasileiros (LAVINA, 2012).

A exploração de madeira, a instalação de grandes fazendas agropecuárias e a mineração são os grandes responsáveis pelo desmatamento na Amazônia. Esse fato gera vários transtornos ambientais em escala global, o que reforça o discurso dos países desenvolvidos, em especial o dos Estados Unidos, sobre a necessidade de internacionalização da floresta que possui a maior diversidade do planeta (CERQUEIRA, 2011).

No ano de 2000, o então candidato à presidência dos Estados Unidos, George W. Bush, disse durante um debate que os países subdesenvolvidos, como o Brasil, deviam pagar suas imensas dívidas externas através da venda de suas florestas tropicais.

As nações desenvolvidas devem estender o domínio da lei ao que é comum a todos no mundo. As campanhas ecológicas internacionais que visam à limitação das soberanias nacionais sobre a região amazônica estão deixando a fase propagandística para dar início à fase operativa, que pode definitivamente ensejar intervenções militares diretas sobre a região (Discurso de John Major, chefe de governo britânico em 1992).

Isso evidenciou o interesse dos países ricos na exploração da floresta em questão, o que seria possibilitado por sua internacionalização. A sua preservação era um mero fator causal. No entanto, como houve uma redução em seu desmatamento, a ideia de sua internacionalização perdeu forças e já está praticamente esquecida.

2.3 DESMATAMENTO: FATORES E REDUÇÃO            

Até o ano de 2004, notícias sobre o desmatamento da Amazônia eram frequentes, tanto que se defendia – e até hoje se defende – como medida eficaz contra tal problema ambiental o denominado “desmatamento zero da Amazônia”, como explicam VIEIRA, SILVA & TOLEDO (2005, p. 156):

Em 2003, o Museu Paraense Emílio Goeldi e a Conservação Internacional elaboraram um documento sugerindo, entre outras coisas, o desmatamento zero na Amazônia, com especial ênfase no chamado “arco do desmatamento”, uma ampla região que se estende do Maranhão até Rondônia. Muitas recomendações propostas pelas duas instituições foram incorporadas pelo governo federal no Plano de Controle e Prevenção do Desmatamento. Entretanto, a recomendação principal não foi adotada. O alto custo político de se tomar uma decisão forte como esta pode ter limitado a ação governamental. Voltamos a insistir que determinar o desmatamento zero na Amazônia por meio de um mecanismo legal é uma necessidade real estratégica para o país, pois tem como propósito evitar a perda de recursos naturais importantes, garantir a ordenação do espaço amazônico e promover o desenvolvimento sustentável na região.

No entanto, tal sugestão tornou-se objeto de diversas críticas, passando-se a utilizar o termo:

desmatamento legal, direcionado para áreas com solos produtivos e adequados para a agricultura. Como essas áreas são, em geral, enclaves na bacia amazônica, elas podem possivelmente abrigar comunidades biológicas únicas e, portanto, recursos genéticos essenciais para a nação. Conceder licenças de desmatamento na ausência de conhecimento adequado da importância estratégica de uma área para a manutenção do patrimônio biológico brasileiro é violar o princípio básico da precaução, tão bem aceito pelos países signatários da Convenção da Diversidade Biológica (VIEIRA, SILVA & TOLEDO, 2005, p. 158)

Não obstante, frisa-se que houve uma redução na taxa de desmatamento. Consoante dados do Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais (INPE), esta foi reduzida de 27.423 km² para 7.008 km² no biênio 2008-2009, conforme explicita CERQUEIRA (2011):

Foram destruídos 7.008 quilômetros quadrados nesse período de 2008 – 2009. O [então]Ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, acredita na possibilidade de o Brasil alcançar em 2020, uma redução de 95% do desmatamento em relação à década anterior.

É possível observar a redução da quantidade de quilômetros quadrados desmatados na Amazônia a partir do ano de 2004, conforme o gráfico seguinte:

           

Gráfico 1 – Desmatamento da Amazônia ao longo da história

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Fonte: http://g1.globo.com/Amazonia.html

Após o ano de 2004, houve uma redução na taxa de desmatamento da floresta amazônica devido ao combate às madeireiras ilegais, aos grileiros de terra e aos pecuaristas (CERQUEIRA, 2011). Todas as pessoas ou empresas que contribuíram para intensificar o processo de desmatamento da Floresta Amazônica, foram enquadrados nas normas do Código Florestal Brasileiro, regulado pela Lei nº 12.651/2012.

2.4 AS ÁREAS DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E O CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO

Com a definição das Áreas de Preservação Permanente, ou APPs (Figura 1), foram estabelecidos limites para o uso da propriedade. A partir de então, ficou mais fácil definir qual punição aplicar contra aqueles que desmatarem as APPs localizadas na Amazônia.

Figura 1 – O código florestal e a área de preservação permanente.

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Fonte:  http://gestaoambientalufsm.blogspot.com.br/2012/11/o-codigo-florestal-e-area-de.html

Define-se Área de Preservação Permanente (APP) como local protegido, coberto ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos; a paisagem; a estabilidade geológica; a biodiversidade; o fluxo gênico de fauna e flora; proteger o solo; e assegurar o bem-estar das populações humanas. Consideram-se de preservação permanente as florestas e demais formas de vegetação natural situadas: (a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água. A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do governo federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social (MORAES, 2005).

O Código Florestal Brasileiro define que qualquer pessoa, física ou jurídica, que desmatar uma APP na Amazônia, sofrerá punições que variam de uma simples advertência até uma restrição de direitos (BRASIL, 2008). Através da aplicação da lei, que regularizou e definiu as áreas que não podem ser desmatadas, ficou mais fácil combater o desmatamento da Amazônia, uma vez que os agentes causadores serão impedidos ou punidos.

No ano de 2012, foi aprovado o novo Código Florestal Brasileiro, no qual foi redefinido quais práticas seriam crimes a partir de então. Como a lei não é retroativa, os produtores rurais que cometeram algum ato que a partir de então é considerado ilegal, não seriam condenados, desde que se cadastrassem em um programa criado pelo Governo.

Os produtores que desmataram acima do permitido por lei até julho de 2008 poderão regularizar sua situação ambiental caso se comprometam com um Programa de Regularização Ambiental e entrem para o Cadastro Ambiental Rural. Se o produtor não aderir a esses programas, ou descumpri-los, voltam a valer todas as multas por descumprimento ao antigo Código Florestal (SILVEIRA, 2012).

O novo Código Florestal, aprovado em 2012, alterou alguns conceitos que estavam estabelecidos desde a aprovação do antigo código, como o método de medição das larguras dos rios.

No entanto, o método de medição da largura dos rios foi alterado, e é isso que define o tamanho da área de preservação permanente (APP) que precisa ser mantida em cada margem. Rios de até 10 metros de largura, por exemplo, precisam de 30 metros de APP de cada lado. A largura dos rios, que era medida pelo leito maior atingido durante a cheia, agora passa a ser medida pela calha regular. Mas atenção: isso não libera produtores a reduzir suas APPs já existentes. Caso a mudança de medição diminua o tamanho da APP exigida, o excedente de mata ciliar poderá ser usado para a compensação de déficits de reserva legal de outras propriedades, por exemplo, mas jamais poderá ser desmatado (SILVEIRA, 2012).

Devido à aprovação desse novo Código Florestal, muitos ambientalistas ficaram preocupados, uma vez que o desmatamento poderia voltar a crescer devido a flexibilização que ocorreu com as leis ambientais.

Para alguns ambientalistas, essa medida vai premiar quem desmatou no passado e punir quem preservou, o que desestimularia o cumprimento da lei. Mas muitas áreas foram desmatadas antes de o conceito de APP aparecer na ciência ou na legislação, por isso os limites aplicados pelo Código Florestal não poderiam valer para o passado. A solução intermediária encontrada foi manter a rigidez sobre novos desmatamentos e reduzir apenas parcialmente a necessidade de recomposição de APPs (SILVEIRA, 2012).          

2.5 A ATUAÇÃO DO INSTITUTO DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE)

Outro recurso, além da definição das áreas de proteção permanente, que ajudou a aumentar a eficiência das normas previstas no Código Florestal e a redução do desmatamento na Amazônia, foi o mapeamento de incêndios florestais e a fiscalização dos focos de incêndio (Figura 2), feita pelo INPE.

O mapeamento de incêndios florestais é feito com base na classificação de imagens do satélite Landsat. Os sensores TM e ETM, a bordo dos satélites Landsat 5 e 7, respectivamente, conseguem diferenciar as marcas deixadas pelo fogo de superfície em florestas da Amazônia. Esta diferenciação é possível, pois estes sensores conseguem capturar a diminuição na proporção de biomassa/necromassa decorrentes do fogo, assim como a redução da quantidade de água no interior da floresta. Essas mudanças geram uma resposta espectral que pode ser detectada em imagens Landsat até, no máximo, um ano após o fogo. Este mapeamento é importante, à medida que pode indicar as áreas florestais que já estão degradadas e são susceptíveis a futuros incêndios (ALENCAR, 2012).

Figura 2 – Focos de incêndio detectados por satélite

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Fonte:  http://www.apolo11.com/meio_ambiente

Os focos de incêndio são identificados pelo satélite, o que possibilita seu controle de forma mais eficaz, uma vez que os bombeiros chegarão de forma mais rápida até o lugar atingido e controlarão o incêndio, o que reduz potencialmente o tamanho do local que seria desmatado, caso o fogo não fosse controlado, da mesma forma como permite a identificação dos incendiários que serão julgados e sentenciados.

2.6 A CONTRIBUIÇÃO DOS TRÊS PODERES

Os poderes legislativos (representado, nesse trabalho, pela câmara dos deputados federais e pelo senado, pois existem outros órgãos legisladores) e judiciário contribuíram para a redução do desmatamento da Amazônia através da criação do código florestal e da aplicação dessa legislação, respectivamente. Ações do poder executivo também tiveram participação na redução do desmatamento da Amazônia, através da criação de projetos que tinham como objetivo barrar esse desmatamento e punir os responsáveis. Segundo o Governo brasileiro (BRASIL, 2011),

o principal instrumento do governo brasileiro para combater o problema é o Plano de Ação para a Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAM), lançado em 2004. Em 2009, o desmatamento na região chegou aos níveis mais baixos das duas últimas décadas, representando uma redução de 75% em relação às taxas registradas em 2004. A redução no desmatamento na Amazônia só foi possível graças às ações integradas entre 13 ministérios, que compreendem cerca de 150 atividades de ordenamento territorial e fundiário, monitoramento e controle ambiental, fomento a atividades produtivas sustentáveis. Além disso, o plano estimula parcerias entre órgãos federais, governos estaduais, prefeituras, entidades da sociedade civil e o setor privado.

Tendo como base os dados apresentados, pode-se afirmar que os três poderes brasileiros agiram de forma convergente, uma vez que a ação de um complementou a do outro. O poder legislativo criou lei que foram aplicadas pelo poder executivo, que identificou infratores e os levou ao poder judiciário para serem julgados. Isso resultou na diminuição do desmatamento da Floresta Amazônica.

3 A APLICAÇÃO DO CÓDIGO FLORESTAL E A REDUÇÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL

Como observado anteriormente, a efetividade na aplicação da legislação florestal brasileira enseja uma significativa diminuição dos índices de desmatamento na mais importante floresta do mundo em biodiversidade, o que não pode ser motivo de comodismo diante dos dados que ainda são preocupantes, de modo que frisa-se, neste ponto, a importância da constância na aplicabilidade efetiva de tais normas, bem como de sua fiscalização para que se logre efeitos determinantes para o futuro não somente da população amazônica ou brasileira, mas de todo mundo.

Não é em vão que a Floresta Amazônica é apelidada de “pulmão do mundo”, haja vista sua grande capacidade natural de filtrar gases que concorrem para o agravamento do efeito estufa. Assim, seguindo uma concepção lógica, percebe-se que freando o desmatamento, mais árvores estarão aptas a fazer o processo de fotossíntese e mais gases como o dióxido de carbono serão filtrados, diminuindo, por conseguinte, as emissões que provocam o aquecimento global.

Tal perspectiva é muito positiva, o que ajuda o Brasil e demais países do planeta a cumprir as metas estabelecidas na última Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP 21), ocorrida em 2015 em Paris, na qual 195 países signatários aprovaram acordo inédito em que estes assumem o compromisso de “trabalhar para que aquecimento fique muito abaixo de 2ºC, buscando limitá-lo a 1,5ºC”, desacelerando a emissão global de gases do efeito estufa de forma gradativa (G1, 2015).Apesar de não se determinar uma meta temporal para que tais reduções devam ocorrer, o Acordo de Paris representa um grande avanço na esfera de mudança climática mundial.

Segundo estudo realizado por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), Instituto Internacional para Análises de Sistemas Aplicados (IIASA, na sigla em inglês) e do Centro para Monitoramento da Conservação Mundial do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP-WCMC), se o Código Florestal for cumprido efetivamente, o Brasil pode zerar suas emissões de gases do efeito estufa causados pelo desmatamento da Amazônia em 2030 (AGÊNCIA FAPESP, 2015). De acordo com Gilberto Câmara – pesquisador do INPE e coordenador do projeto REDD-PAC, o qual a mencionada pesquisa faz parte –, “o Código Florestal poderá ajudar a zerar as emissões de gases de efeito estufa pelo desmatamento da Amazônia se for cumprido. O Brasil não precisa mais de legislação ambiental para conter o desmatamento da Amazônia. Só precisa cumprir a que já tem” (idem).

Para chegar-se a tal constatação, a pesquisa consistiu em fazer-se projeções a partir de determinados cenários, assim definidos:

Um dos cenários não considerou a aplicação do Código Florestal. O segundo cenário foi concebido levando em conta a plena aplicação do Código, que estabelece que não poderá haver mais desmatamento ilegal no país e prevê a recuperação de áreas de reserva legal, assim como o repasse de quotas de reserva ambiental por quem tem mais quotas de florestas do que reserva legal, além da anistia de pequenas fazendas e a obrigatoriedade do cadastro rural ambiental para regularizar as propriedades rurais. Num terceiro cenário, considerou-se que somente produtores agrícolas poderiam comprar quotas de reserva ambiental. O quarto cenário, também com o Código Florestal, foi projetado supondo que somente os pequenos produtores agrícolas teriam que recuperar suas reservas legais. E, no quinto cenário, excluíram-se as quotas de reserva ambiental (AGÊNCIA FAPESP, 2015).

Nesse sentido, constatou-se que no cenário de plena aplicação do Código Florestal, o reflorestamento no Brasil poderá chegar na ordem de 10 a 12 milhões de hectares até 2050, além de “contribuir para reduzir o número de espécies ameaçadas no Brasil e de perda de habitats”. Ademais, inferiu-se que no mesmo cenário, “A combinação de reflorestamento com redução do desmatamento, por força do Código Florestal, poderá fazer com que as emissões por desmatamento no Brasil cheguem a 110 milhões de toneladas de CO2 em 2030 – uma queda de 92% em relação a 2000 quando dois terços das emissões de CO2 do país eram provenientes, principalmente, do desmatamento da Amazônia”, o que levaria o país a zerar suas emissões até o ano de 2030, segundo o coordenador da pesquisa (AGÊNCIA FAPESP, 2015).

Outrossim, segundo outra pesquisa realizada por Tiago Reis, pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), mesmo não sendo o meio totalmente eficaz,

A implantação do Código Florestal é um caminho necessário para se reduzir o desmatamento e oferecer, ao mesmo tempo, uma alternativa econômica à retirada legal, com incentivos como a cota de reserva ambiental. O mecanismo consiste em títulos que representam uma área de cobertura natural em uma propriedade e que podem ser usados para compensar a falta de reserva legal em outra (IPAM, 2016).

Desse modo, é importante ressaltar que outros meios também devem ser utilizados para a devida retirada de emissões de gases poluentes que acarretam o aquecimento global, como a própria pesquisa primeiramente citada aponta. É o caso do uso de energias limpas e “combustíveis renováveis”, como a bioenergia, a exemplo do etanol de cana-de-açúcar (AGÊNCIA FAPESP, 2015).

Outro aspecto que pode ser posto em questão é o fato de se constatar que seriam os oceanos – e recursos hídricos em geral – os verdadeiros “pulmões do mundo”, devido à sua essencialidade, biodiversidade e processos bioquímicos ali existentes, sobretudo nos manguezais, considerados “berços” da biodiversidade marinha. Nessa perspectiva, frisa-se que o Código Florestal analisado neste trabalho também versa em um de seus capítulos sobre o “uso ecologicamente sustentável dos apicuns e salgados”, que são zonas costeiras com alto índice de salinidade, diretamente ligadas ao oceano. Por conseguinte, a aludida legislação, em linhas gerais, traz em seu bojo uma amplitude na salvaguarda de aspectos sustentáveis, incluindo essas áreas relacionadas com os oceanos.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por meio dessa análise foi possível pontuar algumas das principais causas do desmatamento da Amazônia, como a exploração irregular de madeira, a instalação de grandes fazendas agropecuárias e a mineração. Em seguimento à análise, constatou-se a redução no desmatamento da Floresta Amazônica, propiciado por um conjunto de fatores que funcionaram sistematicamente, como o monitoramento dos focos de incêndio pelo INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e o combate às madeireiras ilegais, aos grileiros de terra e aos pecuaristas.        

Posteriormente, concluiu-se que esse combate só foi possível devido à ação conjunta dos três poderes brasileiros, o que possibilitou a definição de quais práticas seriam crimes e em que locais elas seriam proibidas, como nas Áreas de Preservação Permanente (APPs).

Com base em tudo que foi explanado, é possível afirmar que vários fatores acarretaram a redução do desmatamento da Floresta Amazônica, mas houve uma maior eficiência quando esses fatores atuaram de forma convergente, o que foi possibilitado pela lei brasileira vigente.

A necessidade de uma legislação com aplicação mais rigorosa e efetiva, assim como se faz necessário diante de uma situação como a abordada, é fruto de uma deficiência na conscientização sobre a importância da preservação ambiental. A criação de normas que disciplinem o meio ambiente, bem como o seu usufruto consciente, são essenciais em uma nação, independentemente de seu estágio de desenvolvimento. Para tanto, é necessário que essas normas – já existentes – devam ser efetivamente cumpridas.

O crescimento e o desenvolvimento são necessários a todas as nações e não são de todo maléficos. Entretanto, no Brasil, assim como em todos os demais países do planeta, é necessário planejar um crescimento que respeite o tempo de reposição do meio ambiente. Que respeite a Floresta Amazônica, e todas as formas de vida presentes na biosfera, pois todas, desde as microscópicas às macroscópicas fazem parte de um enorme e complexo sistema, em que um desequilíbrio pode representar uma ameaça à vida e à continuidade das espécies.

A educação pautada na conscientização da preservação ambiental é a peça fundamental para a garantia da continuidade das espécies (inclusive a humana!), mas uma continuidade com qualidade de vida, o que é essencial. O comprometimento coletivo das nações acerca deste objetivo, a longo prazo, poderá representar uma mudança no comportamento coletivo e moldar uma sociedade evoluída que saiba associar economia e sustentabilidade de modo a prover a todos uma vida digna, em seu sentido mais amplo.

REFERÊNCIAS

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CERQUEIRA, Wagner. Redução do desmatamento na Amazônia, 2011. Disponível em: < http://www.brasilescola.com/brasil/reducao-desmatamento-na-amazonia.htm>. Acesso em: 10 abr. 2016.

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[1]Discente do 5° período do Curso de Direito da Universidade Estadual do Maranhão. E-mail: lucas-cunha@outlook.com

Como citar e referenciar este artigo:
ARANHA, Lucas de Cássio Cunha. A aplicação efetiva do Código Florestal Brasileiro e a eficiência no combate ao desmatamento da Floresta Amazônica como instrumentos de redução do aquecimento global no século XXI. Florianópolis: Portal Jurídico Investidura, 2019. Disponível em: https://investidura.com.br/artigos/direito-ambiental-artigos/a-aplicacao-efetiva-do-codigo-florestal-brasileiro-e-a-eficiencia-no-combate-ao-desmatamento-da-floresta-amazonica-como-instrumentos-de-reducao-do-aquecimento-global-no-seculo-xxi/ Acesso em: 19 abr. 2024